Com lentidão câmara avança com pacote fiscal de Haddad.
- DispCritic
- 19 de dez. de 2024
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A Câmara dos Deputados avançou lentamente na votação do pacote de corte de gastos encaminhado pelo governo Lula (PT) nesta quarta-feira, 18. A primeira de três propostas foi finalizada, e a análise da segunda começou, mas parte do plano fiscal foi desidratada. A sessão se estendeu até as 23h30, quando o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), suspendeu os trabalhos e convocou os deputados para retomarem a discussão na manhã de quinta-feira.
A proposta de emenda à Constituição (PEC) em debate prevê um corte gradual do acesso ao abono salarial, que atualmente beneficia quem recebe até dois salários mínimos, mas que cairá gradualmente para um salário mínimo e meio até 2035. A PEC também reforça o combate aos supersalários no funcionalismo público e prorroga até 2032 a desvinculação de 30% das receitas da União, permitindo que o governo utilize esses recursos livremente. Para avançar ao Senado, a PEC precisa de no mínimo 308 votos em dois turnos.
Na última segunda-feira, Lira decidiu juntar a PEC do governo a outra proposta de emenda à Constituição apresentada em 2007, acelerando a votação apesar das críticas da oposição. A PEC também define que terá direito ao abono salarial quem ganha até 1,5 salário mínimo, com uma regra de transição.
Horas antes, a Câmara enfraqueceu o primeiro projeto do pacote de corte de gastos. Os deputados aprovaram o texto-base na terça-feira com 318 votos favoráveis e 149 contrários, mas faltava analisar os destaques. Na quarta-feira, a Câmara autorizou o bloqueio apenas de parte das emendas parlamentares para cumprir o arcabouço fiscal, a partir de uma emenda aglutinativa apresentada pelo deputado José Guimarães (PT-CE), líder do governo. Com a nova redação, o bloqueio de até 15% das emendas se aplicará somente às não impositivas, como as de comissão, deixando de fora as emendas individuais e de bancada, cuja execução é obrigatória. A proposição recebeu 444 votos favoráveis e apenas 16 contrários.
O texto também autoriza o governo a restringir o uso de créditos tributários em caso de déficit nas contas públicas. O limite será mensal e variará de acordo com o tamanho da compensação, não atingindo créditos de até 10 milhões de reais. A matéria ainda veda, em um cenário de déficit, a concessão, ampliação ou prorrogação de incentivos fiscais e o aumento das despesas com pessoal acima do limite inferior do arcabouço, ou seja, 0,6% acima da inflação.
A Câmara deve votar nesta quinta-feira outro projeto do pacote de corte de gastos, que restringe o reajuste real do salário mínimo aos limites do arcabouço fiscal, ou seja, correção pela inflação e ganho real entre 0,6% e 2,5%. Com o corte no ritmo de aumento, há uma redução em despesas que se baseiam no mínimo, como benefícios previdenciários, seguro-desemprego e abono salarial. O relator, deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), suavizou as regras previstas inicialmente pelo governo na concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e excluiu mudanças no reajuste do Fundo Constitucional do Distrito Federal.
O BPC é pago a idosos e a pessoas com deficiência que não têm condição de se sustentar. O texto do governo definia como pessoa com deficiência apta a receber o benefício aquele incapacitado para o trabalho e para uma vida independente, mas esse trecho foi suprimido. A nova redação diz que a concessão do BPC a pessoa com deficiência fica sujeita à avaliação que ateste deficiência de grau moderado ou grave. Em outro trecho, mantém a definição mais ampla: impedimentos de longo prazo próprios da pessoa (de natureza física, mental, intelectual ou sensorial) em interação com diversas barreiras existentes na sociedade, que podem obstruir sua participação plena e efetiva em igualdade de condições com as demais pessoas. Bulhões também retirou do texto a medida que limitava os aportes ao Fundo Constitucional do Distrito Federal, que previa correção anual dos valores pela inflação.
Na última terça-feira, o Palácio do Planalto enviou ao Legislativo o projeto que pretende fixar a idade mínima de 55 anos para que os militares possam se aposentar. Esse projeto também faz parte do pacote fiscal, mas não entrará em votação nesta semana. O texto prevê ainda o fim da chamada morte ficta, a pensão paga nos casos de fardados expulsos ou excluídos dos quadros.
Precisamos cortar gastos diz o governo, mas ano que vem tem aumento de salários?
A recente votação da PEC no Congresso Nacional e o pacote de corte de gastos do governo Lula (PT) não passam despercebidos em um cenário onde a economia brasileira enfrenta desafios significativos. A redução gradual do acesso ao abono salarial e a prorrogação da desvinculação de receitas da União até 2032 são medidas que, embora necessárias para controlar o déficit público, podem impactar diretamente a população de baixa renda. A questão dos supersalários no funcionalismo público também é um tema polêmico, pois, apesar de ser um passo importante para a justiça social, pode enfrentar resistência de setores influentes.
Além disso, a decisão de suspender a votação da idade mínima de aposentadoria para militares e a revogação da chamada "morte ficta" são movimentos que podem gerar debates sobre a justiça social e os direitos dos militares. A flexibilização do uso de créditos tributários em caso de déficit também levanta questões sobre a sustentabilidade das políticas fiscais a longo prazo.
No entanto, a provocação maior surge quando consideramos que, enquanto o governo busca cortar gastos e implementar medidas de austeridade, já anunciou aumentos de salários para vereadores, senadores e políticos no próximo ano. Isso levanta a questão: como justificar cortes que afetam diretamente a população mais vulnerável, enquanto os próprios representantes políticos se beneficiam de aumentos salariais? Essa contradição pode minar a confiança pública e gerar um sentimento de injustiça, destacando a necessidade de uma abordagem mais equilibrada e transparente nas políticas fiscais.
Esses eventos são um reflexo das complexidades e dos dilemas que a sociedade enfrenta em busca de um equilíbrio entre a necessidade de ajustes fiscais e a proteção dos direitos sociais. A resposta do público e dos diferentes setores da sociedade será crucial para definir o rumo dessas políticas e seu impacto no futuro do país.
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